quinta-feira, 30 de maio de 2013

Carta de Caymmi a Jorge Amado.

“Jorge meu irmão, são onze e trinta da manhã e terminei de compor uma linda canção para Yemanjá, pois o reflexo do sol desenha seu manto em nosso mar, aqui na Pedra da Sereia. Quantas canções compus para Janaína, nem eu mesmo sei, é minha mãe, dela nasci.
Talvez Stela saiba, ela sabe tudo, que mulher, duas iguais não existem, que foi que eu fiz de bom para merecê-la? Ela te manda um beijo, outro para Zélia e eu morro de saudade de vocês.
Quando vierem, me tragam um pano africano para eu fazer uma túnica e ficar irresistível.
Ontem saí com Carybé, fomos buscar Camafeu na Rampa do Mercado, andamos por aí trocando pernas, sentindo os cheiros, tantos, um perfume de vida ao sol, vendo as cores, só de azuis contamos mais de quinze e havia um ocre na parede de uma casa, nem te digo. Então ao voltar, pintei um quadro, tão bonito, irmão, de causar inveja a Graciano. De inveja, Carybé quase morreu e Jenner, imagine!, se fartou de elogiar, te juro. Um quadro simples: uma baiana, o tabuleiro com abarás e acarajés e gente em volta.
Se eu tivesse tempo, ia ser pintor, ganhava uma fortuna. O que me falta é tempo para pintar, compor vou compondo devagar e sempre, tu sabes como é, música com pressa é aquela droga que tem às pampas sobrando por aí. O tempo que tenho mal chega para viver: visitar Dona Menininha, saudar Xangô, conversar com Mirabeau, me aconselhar com Celestino sobre como
investir o dinheiro que não tenho e nunca terei, graças a Deus, ouvir Carybé mentir, andar nas ruas, olhar o mar, não fazer nada e tantas outras obrigações que me ocupam o dia inteiro. Cadê tempo pra pintar?
Quero te dizer uma coisa que já te disse uma vez, há mais de vinte anos quando te deu de viver na Europa e nunca mais voltavas: a Bahia está viva, ainda lá, cada dia mais bonita, o  firmamento azul, esse mar tão verde e o povaréu. Por falar nisso, Stela de Oxóssi é a nova iyalorixá do Axé e, na festa da consagração, ikedes e iaôs, todos na roça perguntavam onde anda Obá Arolu que não veio ver sua irmã subir ao trono de rainha?
Pois ontem, às quatro da tarde, um pouco mais ou menos, saí com Carybé e Camafeu a te procurar e não te encontrando, indagamos: que faz ele que não está aqui se aqui é seu lugar? A lua de Londres, já dizia um poeta lusitano que li numa antologia de meu tempo de menino, é merencória. A daqui é aquela lua. Por que foi ele para a Inglaterra? Não é inglês, nem nada, que faz em Londres? Um bom filho-da-puta é o que ele é, nosso irmãozinho.
Sabes que vendi a casa da Pedra da Sereia? Pois vendi. Fizeram um edifício medonho bem em cima dela e anunciaram nos jornais: venha ser vizinho de Dorival Caymmi. Então fiquei retado e vendi a casa, comprei um apartamento na Pituba, vou ser vizinho de James e de João Ubaldo,
daquelas duas ‘línguas viperinas, veja que irresponsabilidade a minha.
Mas hoje, antes de me mudar, fiz essa canção para Yemanjá que fala em peixe e em vento, em saveiro e no mestre do saveiro, no mar da Bahia.  Nunca soube falar de outras coisas. Dessas e de mulher. Dora, Marina, Adalgisa, Anália, Rosa morena, como vais morena Rosa, quantas outras e todas, como sabes, são a minha Stela com quem um dia me casei te tendo de padrinho.
A bênção, meu padrinho, Oxóssi te proteja nessas inglaterras, um beijo para Zélia, não esqueçam de trazer meu pano africano, volte logo, tua casa é aqui e eu sou teu irmão Caymmi”.
Até eu senti saudade de receber uma carta assim...

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Ilusões Perdidas (Honoré de Balzac)

Outro dia estava na Leitura no Shopping Del Rey e alguns livros chamaram minha atenção pelas cores, por ser encadernação com tecido... enfim, eram livros bonitos que fazem parte do Clássicos Abril Coleções (para quem se interessar, aviso que já esgotou essa coleção, o que é uma pena) e acabei comprando dois livros que, apesar de já ter lido, são livros que me interesso em ler uma segunda vez. Na verdade gostaria de ter comprados outros, mas a maioria faltava um dos volumes ou estava em péssimas condições, na verdade estavam numa banca, daquelas de liquidações. Sim, mulher adora uma liquidação, mesmo em livrarias.

Um deles é Ilusões Perdidas de Honoré de Balzac, que já havia começado a ler há muitos anos, mas não consegui terminar a leitura, pois emprestei de uma amiga e tive que entregar meio as pressas, pois ela iria se mudar. Enfim, não consegui saber o que aconteceu com o protagonista, o rapaz sonhador que se deslumbra com a sociedade parisiense do século XIX.

O livro conta a trajetória de Lucien Chardon (ou Rubempré), um rapaz inteligente, que cria grandes expectativas em sua mãe, irmã e amigo/cunhado David Séchard. Ele se envolve a Sra. Bargeton e, seduzido pelas possibilidades que ela conta, sai  de Angoulême com destino a Paris, acreditando que obterá sucesso e fama.

Em Paris, após ser abandonado pela Sra. Bargeton, que não suportou a pressão da sociedade, Lucien consegue uma oportunidade de trabalhar no jornalismo. De imediado ele toma conhecimento do "jogo": escrever para agradar a quem for mais conveniente! Ou seja, ética não é a palavra de ordem no meio jornalístico, que pode levar um escritor a ascensão ou acabar com sua carreira, antes mesmo de começar! Lucien por sua vez é ganancioso e com uma moral bastante duvidosa, portanto, logo ele entra no "jogo" e obtém sucesso.

Lucien vive em meio a aristocracia, inspira medo e respeito, trai amigos e faz conchavos políticos, tudo em nome da ganância, do status e do lucro rápido. Mas sua fama incomodou pessoas que sabiam jogar  o mesmo jogo, portanto logo sua fama foi destruída em articulações criadas para esse fim. No final Lucien descobre-se só, sem dinheiro e sem relações de amizade ou familiar, desiludido pelo fracasso, após tantos sonhos de fama e glória.

Considero Ilusões Perdidas um livro com uma moral que devemos ponderar: até que ponto deve prevalecer nossa ambição? A que custo esperamos obter sucesso? Vale refletir.


A foto está péssima (de celular), mas são dois volumes, encadernação capa dura revestida com tecido e tem várias notas de rodapé (adoro essas notas). As últimas páginas do Volume I são dedicadas a um perfil do autor e as últimas do Volume II são para falar sobre a obra.

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Viver o que se prega!


Nem sempre é fácil viver de acordo com o que se prega! Se algo acontece com seu vizinho, você sabe de pronto o que faria se fosse na sua casa, mas quando é na sua casa, sua perspectiva muda, as decisões ficam mais difíceis de serem tomadas e, muitas vezes é preciso ter uma atitude que, por mais justa e correta que possa ser, em determinado momento vai parecer exagerada, radical demais, desleal...

Ser imparcial é difícil, é um exercício solitário! Ter que decidir entre se calar, se omitir ou criar uma situação em que alguém próximo, precisa responder por suas irresponsabilidades, é muito desgastante! A decisão deve ser pensada e repensada e mesmo assim pode surgir um TALVEZ quando pensar no assunto. Não é como um arrependimento, pois sabe-se que a decisão foi correta, foi acertada, mas não tem como fugir do incomodo sentimento de ter agido com deslealdade.

Hoje entendo um pouco melhor as pessoas que vi se omitirem, se calarem, se acovardarem! Não é uma atitude digna de respeito, mas de compreensão. Não se pode exigir de alguém algo que, mesmo sem arrependimentos, você preferiria não ter que fazer!

Aí você lembra de algo que ouvia desde criança, que "remédio amargo é o que cura", então seu consolo é que esse gostinho amargo que fica, seja a "cura" para o mal que você quis evitar!